Triora é uma bela cidadezinha medieval italiana localizada no alto do Valle Argentina, nos Alpes Lígures.

A cidade é chamada de Salém da Itália e esse apelido não foi dado por acaso.

Culpem as bruxas de Triora!

No fim do verão de 1587, uma escassez de alimentos, e por consequência fome, castigava a população de Triora há mais de dois anos.

Exaustos da situação, os habitantes começaram a suspeitar que quem estava provocando a escassez de alimentos na cidade eram as bruxas da região, que viviam em um bairro chamado Cabotina.

As “bruxas” foram identificadas, presas e submetidas à justiça.

O primeiro julgamento

Dois vigários foram chamados para investigar a situação e aplicar as penas, sendo um deles o vigário do Inquisidor de Gênova.


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O julgamento começou em outubro e quando um dos vigários denunciou publicamente as más ações diabólicas perpetradas pelas bruxas em Triora, o povo se inflamou e se enfureceu com as acusadas.

Cerca de vinte mulheres foram presas em casas adaptadas para “prisão de bruxas”. Treze mulheres foram imediatamente declaradas culpadas, além de mais quatro meninas e um menino.

Com a intenção de que “confessassem suas bruxarias”, essas pessoas foram submetidas às mais atrozes torturas e, possivelmente, pela genialidade das acusadas, elas começaram a confessar quem eram seus cúmplices, incluindo diversas pessoas da nobreza local.

Assim, a população de Triora e os nobres, claro, ficaram intimidados. Diante das acusações às nobres, eles começaram a “desconfiar” de que os métodos e condutas empregadas pelos vigários estavam erradas.

O Conselho dos Anciãos

 O Conselho do Anciãos, órgão formado pelas famílias nobres e ricas da cidade, foi interferir em favor das acusadas junto ao governo de Gênova (responsável por Triora).

Eles alegaram que o julgamento não era confiável e que estavam preocupados com a segurança das “bruxas”, pois uma já tinha morrido quando caiu de uma janela tentando se livrar das torturas.

Palazzo Stella, onde as “bruxas” foram presas. De uma dessas janelas, Isotta Stella caiu tentando se livrar dos torturadores.

Os Anciãos também denunciaram o tratamento dado às mulheres e o fato de que quatro delas estavam presas ainda que não tivessem confessado nada, nem sob tortura.

O apelo dos Anciãos de pouco ajudou, apenas conseguiu que as mulheres da nobreza local, denunciadas como cúmplices pelas acusadas, ficassem “imunes” de serem presas. Os vigários foram embora da cidade meses depois e deixaram as “bruxas” ainda na prisão de Triora.

Os vigários acusados de torturarem uma das mulheres, Isotta Stella, até que ela se jogasse da janela, se defenderam dizendo que a acusada não se jogou por causa da tortura, mas porque tinha sido “tentada pelo diabo”.

O segundo julgamento

Depois de cinco meses da prisão das mulheres, os governantes genoveses enviaram seu inquisidor-chefe para fazer o julgamento.

Todas as acusadas, menos uma, negaram a “confissão” que fizeram aos vigários. Mesmo assim, o inquisidor decidiu manter todas elas presas, menos uma garota de 13 anos, que foi solta e excomungada.

Em junho de 1588, as mulheres presas foram transferidas à Gênova, onde sofreram novas torturas nas mãos do comissário extraordinário Giulio Scribani.

Segundo um relatório enviado ao governo genovês, Scribani disse ter identificado três “bruxas”, que mesmo sem ter sofrido torturas, supostamente, teriam se confessado culpadas de atos horrendos, como assassinatos de crianças do vilarejo de Andagna.

O comissário ainda processou cerca de mais vinte mulheres das localidades de Castelfranco, Montalto Ligure, Porto Maurizio e Sanremo.

Em julho, Scribani enviou às autoridades que executariam as sentenças, as atas dos interrogatórios juntamente com o pedido de sentença de morte para quatro mulheres de Andagna. 

O fim das bruxas de Triora

Finalmente, em 23 de abril de 1589, o longo processo contra as bruxas de Triora teve fim. Segundo consta, cinco mulheres no total foram enforcadas e depois queimadas, de acordo com suas sentenças.

Nesse tempo em que essas mulheres ficaram presas em Gênova, cinco delas morreram na prisão, incluindo duas que tinham sido condenadas à morte. Das demais, não se têm registros de seus destinos, mas acredita-se que foram enviadas de volta aos seus vilarejos.

A nossa Triora de cada dia

A história da caçada às bruxas em Triora pode parecer fantástica, bárbara, algo que passou há mais de 400 anos e que nunca mais irá acontecer.

Porém, podemos perceber elementos dessa história que não mudaram nos dias de hoje.

Quando a população de Triora se viu passando por um período difícil, logo foram “inventar” uma causa para a falta de alimentos. O bode expiatório escolhido foi as “bruxas”.

Essas chamadas “bruxas”, eram mulheres pobres, muitas eram curandeiras, que utilizavam conhecimentos milenares sobre como usar ervas para curar doenças em uma época em que a medicina mais matava do que curava.

Por seu conhecimento de cura com ervas, eram consideradas bruxas, porque como as pessoas não entendiam aquilo, já achavam que “não era de Deus”.

Outras mulheres eram velhas, viúvas, pessoas já mal vistas pela sociedade. Eram os elos fracos.

O fato de que as mulheres da nobreza foram poupadas, também certamente mostra outro aspecto da sociedade que continua nos dias atuais. Mesmo acusadas, pelo fato terem dinheiro e poder, teve gente que foi lutar por elas e, assim, se safaram. Pois é, só pobre vai para prisão e para a fogueira!

Além de tudo, apenas mulheres foram acusadas, torturadas e assassinadas. O único exemplar masculino relatado foi um menino pobre, que até desaparece dos relatos, provavelmente por ter sido solto.

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